sexta-feira, 17 de novembro de 2017

"ILHA DO PRÍNCIPE" SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN




“Suave, doce, lânguida ilha
de transparências súbitas”
Ruy Cinatti

A ilha do príncipe que o Ruy Cinatti amou
Surgia devagar
E ele debruçado na amurada do navio
A viu emergir dos longes da distância
No lento aproximar
Flor que desabrocha à flor do mar
Entre alísios vidros e neblinas
Na salgada respiração da vastidão marinha
Na transparência súbita

Eu cheguei mais tarde no ronco do avião
Na bruta rapidez
Porém também eu me banhei nas longas ondas
Das praias belas como no princípio do mundo
E atravessei o verde espesso da floresta
E respirei o perfume da ocá recém-cortada
© SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN
In Ilhas, 1989
Poemas reencontrados

quinta-feira, 16 de novembro de 2017

"SONETO 128" SHAKESPEARE (1564-1616)






Música minha, a música tocando

Que em bendita madeira os sons recreia

sob os teus doces dedos ondulando,

em concórdia das cordas que me enleia,

invejo às teclas saltitar macio
a beijar-te por dentro a tenra mão

e ficam os meus lábios de pousio,

corando ao pé de ti de ousada acção?

Pois trocavam de estado, nessa airosa

titilação, com nicos tão esquivos,

Se da pressa gentil dos dedos goza

madeira morta mais que lábios vivos.

Felizes teclas, num descaro assim:

dá-lhes os dedos e a boca a mim.



Shakespeare, William (1564-1616)