quarta-feira, 30 de setembro de 2015

"ARTE POÉTICA" DE ANTÓNIO RAMOS ROSA

 
Se o poema não serve para dar o nome às coisas
outro nome e ao seu silêncio outro silêncio,

se não serve para abrir o dia
em duas metades como dois dias resplandecentes

e para dizer o que cada um quer e precisa
ou o que a si mesmo nunca disse.

Se o poema não serve para que o amigo ou a amiga
entrem nele como numa ampla esplanada
e se sentem a conversar longamente com um copo de vinho na mão
sobre as raízes do tempo ou o sabor da coragem
ou como tarda a chegar o tempo frio.

Se o poema não serve para tirar o sono a um canalha
ou ajudar a dormir o inocente
se é inútil para o desejo e o assombro,
para a memória e para o esquecimento.

Se o poema não serve para tornar quem o lê
num fanático
que o poeta então se cale.

                                                      António Ramos Rosa, in Revista Sílex, 1980

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

PRÉMIO LITERÁRIO JOÃO DA SILVA CORREIA - CATEGORIA POESIA 2015

 
 
 
Estão abertas as candidaturas ao Prémio Literário João da Silva Correia na categoria Poesia que visa distinguir obras inéditas em língua portuguesa.
 
A entrega de trabalhos decorre até ao próximo dia 25 de Setembro. Os concorrentes devem ser naturais ou residentes de S. João da Madeira ou ter ascendência sanjoanense (pais ou avós) ou desenvolver actividade neste município (estudo ou trabalho).
 
O prémio traduz-se num apoio monetário à publicação da obra vencedora, até ao montante máximo de 2.000 euros.
 
Para mais informações deverá consultar o regulamento do prémio disponível em http://www.cm-sjm.pt/files/21/21245.pdf

terça-feira, 1 de setembro de 2015

"No Entardecer dos Dias de Verão" de Alberto Caeiro

 

No entardecer dos dias de Verão, às vezes,
Ainda que não haja brisa nenhuma, parece
Que passa, um momento, uma leve brisa...
Mas as árvores permanecem imóveis
Em todas as folhas das suas folhas
E os nossos sentidos tiveram uma ilusão,
Tiveram a ilusão do que lhes agradaria...
Ah, os sentidos, os doentes que vêem e ouvem!
Fôssemos nós como devíamos ser
E não haveria em nós necessidade de ilusão ...
Bastar-nos-ia sentir com clareza e vida
E nem repararmos para que há sentidos ...
Mas graças a Deus que há imperfeição no Mundo
Porque a imperfeição é uma cousa,
E haver gente que erra é original,
E haver gente doente torna o Mundo engraçado.
Se não houvesse imperfeição, havia uma cousa a menos,
E deve haver muita cousa
Para termos muito que ver e ouvir ...

Alberto Caeiro, in "O Guardador de Rebanhos - Poema XLI"
Heterónimo de Fernando Pessoa (1889-1935)